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Ativista presa pelos talibãs relata o pesadelo que passou no Afeganistão

É com vários traumas que Roqia Saee guarda memórias sobre o período em que esteve presa no Afeganistão. Viúva e mãe de dois filhos, a ativista não conseguiu se conformar com o rumo do país depois dos talibãs terem recuperado o poder. Ciente que as mulheres teriam cada vez menos direitos, participou em inúmeros protestos contra o regime e foi detida duas vezes, uma em 2022 e outra em 2023. Em ambas as situações foi submetida a torturas físicas e psicológicas que garante que nunca irá esquecer. Agora em exílio na Alemanha, conta alguns detalhes sobre o tempo que passou nas mãos dos talibãs. 

No dia 22 de dezembro de 2022, Roqia Saee juntou-se a outras mulheres afegãs em Dehbori, Cabul, para exigir que os talibãs lhes devolvessem o direito à educação e ao emprego. Quando a manifestação começou, as forças de segurança talibãs chegaram e começaram a atacar todos. As mulheres dispersaram e Roqia entrou em um táxi, mas eles a perseguiram e a pegaram.

“Bateram na minha orelha esquerda com os punhos. Nesse momento, senti o tímpano arrebentar e fiquei tonta. Depois disso, não resisti e entrei no veículo deles”, conta Roqia, ao El País.

A afegã foi levada, juntamente com outras quatro manifestantes, para uma esquadra da polícia. “Fui vendada, amarraram minhas mãos e me jogaram água fria antes de começar o interrogatório”.

Depois de ser interrogada diversas vezes, Roqia foi sujeitada a tortura física e psicológica. “Fizeram-me perguntas de uma forma aterradora, me bateram, me apontaram uma arma na cabeça e ameaçaram me dar um tiro. A minha cabeça girava, as minhas mãos e pés tremiam, não conseguia me mexer e estava aterrorizada”, recorda.

Assim que deixou de ser interrogada, a ativista foi presa em uma cela que dispunha de um colchão, um cobertor e uma almofada. A privacidade não existia, uma vez que a cela tinha uma câmera de vídeo. 

Roqia relembra que durante todo o período em que esteve presa, os talibãs se dirigiram a ela de forma depreciativa. “Embora soubessem o meu nome, nunca o usaram durante os interrogatórios. Referiam-se sempre a mim como uma prostituta”, diz.

Segundo o El País, quatro dias depois, Roqia foi libertada com a condição de não falar sobre a sua detenção nem voltar a sair à rua para protestar. Apesar do medo e das ameaças, a ativista sentia que não podia ficar em silêncio e, assim, em 26 de março de 2023, juntou-se a outro protesto em Cabul contra o encerramento de escolas secundárias para mulheres afegãs.

A polícia acusou as mulheres e Roqia foi novamente detida. Desta vez por menos tempo, uma vez que um dia depois acabou por ser libertada. Conta que foi obrigada a gravar um vídeo em que admitia ter cometido um crime e recusou explicar os detalhes sobre o que aconteceu. 

Atualmente na Alemanha, Roqia sente-se segura, mas confessa que há “feridas invisíveis que permanecem abertas” daquele tempo.

“Acordei muitas vezes gritando por causa de pesadelos. Tomei medicação durante muito tempo, mas era impossível dormir mais de duas horas”, revela.

Em algumas ocasiões, os talibãs divulgaram vídeos nos quais mulheres detidas confessam ter participado de protestos porque obedecem a ordens estrangeiras e recebem pagamento por isso, porque desejam asilo fora do Afeganistão ou porque querem difamar as autoridades de fato. Esses depoimentos são divulgados publicamente e são uma maneira de silenciar a dissidência interna e também deslegitimar as denúncias das organizações de direitos humanos.

O Afeganistão ocupa a última posição (177ª) no último Índice Global de Paz e Segurança das Mulheres, elaborado pelo Instituto de Georgetown para Mulheres, Paz e Segurança e pelo Instituto de Pesquisa da Paz de Oslo (PRIO, na sigla em inglês) e publicado em outubro de 2023.

*Fonte: El País

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