MS Delas

Search
Close this search box.
25°C

MARCO TEMPORAL

Muito se comentou sobre esse julgamento e resolvi fazer um pequeno resumo do que ocorreu e citar alguns pontos importantes dos votos proferidos, sem entrar no mérito e sem medo de ser feliz.

No dia 21 de setembro, por 9 votos a 2, o Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que o reconhecimento do direito dos povos indígenas à terra independe da existência de um marco temporal. 

Esta matéria está sendo analisada pelos ministros no RE 1.017.365 (Tema 1.031 da repercussão geral) e se refere à reintegração de posse de uma área de Santa Catarina reconhecida como de ocupação tradicional indígena, com votos contrários.

O resultado do mérito foi proclamado, mas como a matéria é muito extensa e traz consequências outras, o  julgamento foi suspenso e será retomado na semana que vem para a fixação da tese de repercussão geral.  

A controvérsia, porém, é apenas o pano de fundo para a discussão acerca da ideia de que os povos tradicionais só têm direito às terras que ocupavam na data de promulgação da Constituição em 05 de outubro de 1988.

O voto proferido pelo relator Ministro Edson Fachin foi seguido pela maioria  e em síntese seu entendimento é de que não há fundamento no estabelecimento do marco temporal e que a demonstração da tradicionalidade deve ser feita conforme os usos, os costumes e as tradições das comunidades.

O voto decisivo contra a tese foi o do ministro Luiz Fux, que tomou o seu lugar ao lado de Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli. Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Rosa Weber se uniriam a eles em seguida. André Mendonça e Nunes Marques votaram favoravelmente à tese.

O ministro Fux, por sua vez, acompanhou o posicionamento do relator, mas preferiu não fixar uma tese de repercussão geral, para debater o tema posteriormente.

A ministra Cármen Lúcia considerou que as terras são direitos fundamentais, de forma que não podem ser diminuídas, nem fisicamente, nem no tempo. De acordo com ela, a ideia de um marco é contrária à de direitos fundamentais e à de manutenção da integridade e identidade indígena.

O decano, Gilmar Mendes, passou boa parte do voto criticando a teoria da posse imemorial — que permitiria a reivindicação de terras ocupadas em tempos remotos, já perdidos na memória.

Gilmar Mendes afirmou haver um mal-entendido em relação ao marco temporal, de que chancelaria “eventuais barbáries contra indígenas, admitindo que os índios que tivessem sido expulsos e lá (no território) não estivessem em 05 de outubro de 1988 não seriam considerados. Ao contrário. Essa hipótese estaria contemplada, assegurou.

A presidente da Corte, ministra Rosa Weber, limitou-se a dizer que acompanharia na íntegra o voto do relator.

Na sessão anterior, o ministro Dias Toffoli sublinhou que o Supremo estava “a julgar a pacificação de uma situação histórica. Estamos a julgar não situações concretas, estamos julgando o destino dos povos originários do nosso país.”

Em seu voto, considerou que o constituinte não optou pela teoria da posse imemorial. É preciso um vínculo, que não está obrigatoriamente relacionado a 05 de outubro de 1988, resumiu.

O tópico sobre a necessidade de indenizar quem, licitamente e de boa-fé, ocupou terras indígenas e lá realizou obras de desenvolvimento é pacífico entre os ministros. A extensão do dever de indenizar, contudo, é o que suscitou divergências.

O ministro Fachin limitou-se ao direito à indenização das benfeitorias, no que foi seguido pelas ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber.

Gilmar Mendes votou com Moraes, que foi além e acrescentou a necessidade do direito à indenização do valor da terra nua e estabeleceu que o ressarcimento deve ser prévio.

O ministro Zanin sugeriu que o direito à indenização contemple as benfeitorias e a terra nua, estabelecendo que a aferição da indenização deve ser feita via procedimento judicial ou extrajudicial, não no processo de demarcação.

Em síntese esse é o panorama atual a respeito da discussão do marco temporal e sua aplicação, e que restou protegido o direito das ocupações tradicionais indígenas, que celebraram a notícia com muita dança e agradecimentos.

Dra. Iacita Azamor Pionti

Advogada e presidente do Conselho Municipal dos Direitos das Mulheres

Você também pode gostar...