“Eu tenho o vício da defesa da liberdade. Não escolho causas para defender alguém.” (Evandro Lins e Silva)
E o que é a liberdade? O conceito mais recorrente é de que seria o direito de agir segundo a sua própria vontade, de acordo com o seu próprio livre arbítrio.
Portanto, de forma simplista sem muito filosofar, ser livre é poder escolher entre fazer ou não fazer algo, a real possibilidade de fazer escolhas e o direito de coloca-las em pratica, a verdadeira manifestação da liberdade.
Contudo essas escolhas podem ser de algum modo conduzidas por circunstâncias que decorrem de vínculos afetivos, princípios da moral e da ética, e em tais circunstâncias são eivadas de vícios, posto que as influências externas se transformam em concepções internas e deste modo conduzir a um caminho, onde a liberdade será restringida e contaminada por essas influências, presente o vício da vontade.
Além disso, se pararmos para analisar as escolhas que fazemos “livremente”, elas já estão predeterminadas de alguma maneira pelas experiências e informações arquivadas em nossa mente que já teriam contribuído para a formação de nosso modo de ser, e por corolário nos conduzido a determinados caminhos.
O que existe, na verdade, é uma espécie de pseudoliberdade no que diz respeito às nossas escolhas, pois o que procuramos e o que de fato alcançamos é a sensação de liberdade e não a liberdade em “sentido puro”, a qual é muito improvável que exista.
Lendo um pouco mais sobre o assunto, nos deparamos logo com Kant, e segundo ele, a liberdade é agir segundo leis e os homens são livres quando incitados a agir.
Para Kant a liberdade, num conceito negativo, é a ausência de determinações externas do comportamento, porém, a liberdade tem leis, e se essas leis não são externamente impostas, só podem ser autoimpostas e esse seria o conceito positivo.
Ele designa a liberdade como autonomia, ou a propriedade dos seres racionais de legislarem para si próprios. Liberdade e moralidade são indissociáveis. Tratando-se de leis morais ou de normas jurídicas, o fundamento de ambos é a autonomia da vontade. Quanto aos deveres morais, os homens são responsáveis perante a si mesmos; na esfera jurídica, são responsáveis perante os demais.
Segundo Kant, a sociedade se organiza conforme a justiça, quando cada um tem a liberdade de fazer o que quiser, contanto que não interfira na liberdade dos demais e por ele pode ser definido nessa frase: ‘’O direito, como legislação constitutiva da sociedade justa e matéria por excelência da atividade política, realiza, no plano das relações sociais, aquilo que constitui essencialmente o homem: a liberdade, tanto no sentido negativo como positivo do termo”.
Kant é um teórico do liberalismo, concebe o Estado como instrumento necessário da liberdade de sujeitos individuais.
Quando unidos para legislar, os membros da sociedade civil são denominados cidadãos, que exercitam a sua cidadania, cujas características são: autonomia, igualdade perante a lei e a independência. Essa concepção de cidadão tem como base os direitos inatos da liberdade e da igualdade.
Cidadãos, cidadania, nos levam à Constituição Federal, a nossa Constituição cidadã, que protege a nossa República e o estado democrático de direitos.
Nessa Constituição, legítima e repúblicana, a lei é autônoma, manifesta a vontade do povo, e não a vontade de indivíduos ou grupos particulares. Seu princípio é a liberdade, nela se conjugam a soberania popular e a soberania do indivíduo na esfera juridicamente limitada dos seus interesses e valores particulares.
Seria ela a melhor forma de governo do ponto de vista da sociedade e esta avança por efeito da contrariedade das opiniões, dos interesses particulares e nacionais.
Em seu ensaio ‘’A paz perpétua’’, de 1795, Kant instrui os homens de seu tempo sobre a necessidade da paz e incumbe aos indivíduos constituir-se em sociedade civil, é dever do Estado, enquanto pessoas morais, pactuar entre si o fim das hostilidades de acordo com a razão e estabelecer a comunidade jurídica internacional.
Acho que nossos governantes estão precisando voltar a ler Kant para restaurar a cultura da paz, para que as guerras não mais aconteçam e que as nações e seus cidadãos sejam livres, que caminhem sem violência e como irmãos, que suas liberdades individuais sejam respeitadas e que a igualdade e a os direitos humanos ecoem em todo o mundo, que possamos caminhar de mãos dadas e sem medo de ser feliz!
Dra. Iacita Azamor Pionti
Advogada e presidente do Conselho Municipal dos Direitos das Mulheres
Referência: KANT, I. 1980: Critica da Razão Pura. Trad. Valério Rohden e Udo Baldur Moosburger. In: Col. Os Pensadores. Abril Cultural. São Paulo.