Nesta semana, o Brasil viu a justiça ser feita no caso que expôs as entranhas de uma realidade sombria em nosso País e no mundo: Sophia, uma menina de apenas 3 anos, teve sua curta vida arrancada de forma brutal em Campo Grande (MS). O padrasto foi condenado por estupro e homicídio qualificado, e a mãe, que tinha como missão proteger a sua filhinha, foi responsabilizada por omissão. A condenação é um alívio em meio à dor, mas nada apaga a tragédia que nos leva a refletir: como deixamos Sophia chegar a esse ponto?
A história de Sophia não é apenas um caso isolado de violência doméstica. É um retrato cruel de um País em que milhares de crianças vivem sob o peso do medo, da negligência e da violência.
De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, mais de 62 mil casos de violência sexual contra crianças e adolescentes foram registrados em 2022, sendo que mais de 60% das vítimas tinham menos de 14 anos.
Conforme dados da nova edição do relatório do UNICEF, olhando para 2021, 2022 e 2023. A extensão territorial agora analisada é nacional, trazendo dados referentes às 27 Unidades da Federação. Nesse período, foram contabilizadas 15.101 vítimas letais de Mortes Violentas Intencionais (MVI) e 164.199 vítimas de estupro e estupro de vulnerável entre 0 e 19 anos. Os números impressionam e dão conta de um cenário de muito risco para crianças e adolescentes no País.
Para agravar ainda mais essa tragédia, dados da Childhood Brasil mostram que 70% dos abusos ocorrem dentro de casa, cometidos por pessoas próximas, como padrastos, pais ou parentes.
Sophia não teve voz. Sofreu calada até que sua dor não pudesse mais ser ignorada. O que mais revolta nesse caso é a omissão de quem deveria protegê-la. A mãe, cúmplice pelo silêncio, falhou em sua missão mais sagrada. A avó, ciente do que acontecia à menina, negou no júri que sabia da verdade aterrorizante. Essa falha é um reflexo de uma sociedade que ainda não aprendeu a proteger as suas crianças.
Quantas Sophias existem hoje em lares onde o perigo está dentro de casa? Quantas crianças convivem com o medo diário de seus próprios responsáveis? A resposta está nos números aterrorizantes como pudemos constatar, mas também nos relatos que chegam às manchetes todos os dias. Sophia não é a primeira, e, infelizmente… não será a última.
A condenação dos responsáveis pela morte de Sophia traz uma sensação de justiça, mas não podemos nos enganar – ela é apenas um passo em uma luta muito maior.
Precisamos transformar a dor dessa tragédia em um compromisso coletivo. É de extrema urgência o fortalecimento das redes de proteção à infância, a capacitação de profissionais para identificar sinais de abuso, e até mesmo nas escolas para que esse abuso possa ser identificado, investir em campanhas que incentivem a denúncia e o acolhimento das vítimas.
Sophia foi um anjo que voltou para o céu da forma mais cruel, mas sua história não pode ser esquecida. Sua memória deve ser um chamado à ação, um lembrete de que cada criança tem o direito de ser protegida, amada e ouvida. Que o sofrimento de Sophia seja a faísca para que nenhuma outra criança enfrente o mesmo destino.
O Brasil precisa enxergar suas crianças. Precisa ouvir seus silêncios e agir antes que seja tarde demais. Sophia não pôde ser salva, mas sua história pode salvar a muitas outras vidas. Que ela descanse em paz, e que nós nunca nos esqueçamos do dever de proteger aqueles que dependem de nós para sobreviver.
Olga Cruz