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No intrincado universo da mente humana — onde ciência e curiosidade se entrelaçam — seguem vivas as indagações sobre como opera o cérebro de canhotos e destros.
Entre as questões mais recorrentes está a possibilidade de que a escolha por uma mão dominante revele traços de personalidade, habilidades cognitivas ou dons específicos. Essas incógnitas que misturam fascínio e mistério continuam a estimular debates e hipóteses em diversas áreas do conhecimento.
Como consequência desse interesse, multiplicaram-se mitos que tentam decifrar as diferenças entre usuários da mão direita e aqueles cujo impulso natural reside na esquerda.
Tornaram-se populares crenças de que os canhotos são mais criativos, pois seus cérebros seriam guiados pela intuição e imaginação, enquanto destros, por outro lado, são vistos como portadores de uma lógica governada pela estrutura e razão. Porém, tais generalizações carecem de fundamentos sólidos.
Ao analisar criticamente essas narrativas sobre canhotos e destros, torna-se evidente a quantidade de suposições negativas associadas àqueles que têm preferência pela mão esquerda.
Por exemplo, na Idade Média, havia o temor de que canhotos fossem acusados de bruxaria, pois eram socialmente vinculados a práticas condenáveis.
Já no início do século XX, professores nos Estados Unidos chegavam a “reeducar” crianças para que passassem a escrever com a direita; muitos adultos, hoje, atribuem dificuldades diárias ao fato de viverem em um “mundo criado para destros”.
No campo científico, resultados são variados: algumas pesquisas sugerem vantagens, outras apontam riscos para quem é canhoto. Décadas atrás, postulava-se que a canhotice poderia resultar de lesões cerebrais ainda no útero.
Em 1988, os psicólogos Diane F. Halpern e Stanley Coren publicaram na Nature o artigo “Do right-handers live longer?”, sustentando que canhotos viveriam, em média, nove anos a menos — hipótese depois refutada por novos estudos.
As estatísticas mostram que apenas 10% da população mundial é canhota. Cerca de 1 % é ambidestra, dominando igualmente ambas as mãos.
O enigma central é saber se o organismo dos canhotos funciona de forma distinta do dos destros e se existem diferenças relevantes no estado geral de saúde.
Entendendo a lateralização cerebral
Compreender o tema exige conhecer a lateralização, isto é, a divisão estrutural ou funcional entre os hemisférios esquerdo e direito do cérebro.
Segundo o neurologista Alejandro Andersson, em pessoas destras, geralmente, a fala, a linguagem e o controle motor concentram-se no hemisfério esquerdo; em canhotos, há tendência de predominância do hemisfério direito, o que explica maior destreza com o lado esquerdo do corpo e melhor visão ou audição nesse lado.
Mitos e estudos sobre coeficiente intelectual
Um mito polêmico sugere vantagem intelectual de um grupo sobre o outro. Um estudo de 2015 na “Neuroscience & Biobehavioral Reviews”, reunindo dados de mais de 16 mil participantes, não encontrou diferença no QI médio entre canhotos e destros, embora tenha verificado que os canhotos pareciam ter mais probabilidade de apresentar uma deficiência intelectual.
Por outro lado, indivíduos superdotados ou de desenvolvimento típico mantêm a mesma chance de serem canhotos.
Diferenciações genéticas e habilidades verbais
Um artigo da Brain (2019) identificou diferenciações genéticas entre canhotos e destros. Em análise de 400 mil pessoas, constatou-se que os hemisférios cerebral esquerdo e direito mostram melhor conectividade em áreas de linguagem nos canhotos, sugerindo eventuais vantagens verbais.
Pesquisadores também apontam que a mão dominante pode influenciar julgamentos abstratos. Estudo da Universidade de Stanford pediu a voluntários que avaliassem desenhos em colunas opostas: os canhotos, de forma implícita, escolheram as ilustrações da coluna esquerda, enquanto os destros tenderam a optar pelas imagens do lado direito.
Para o autor Daniel Casasanto, “os canhotos pensam de forma implícita que o bom está à esquerda e o ruim à direita, enquanto o oposto ocorre com os destros”.
Base biológica

A origem da dominância esquerda ainda intriga. Cientistas britânicos observaram que fetos de mulheres grávidas sob alto estresse tinham maior probabilidade de tocar o rosto com a mão esquerda em vez da direita. Isso poderia sinalizar futura preferência manual.
Uma pesquisa sueca acompanhou mães e filhos de cinco anos e verificou que mulheres deprimidas ou estressadas durante a gestação apresentavam maior chance de ter filhos canhotos ou ambidestros.
Segundo Andersson, as causas da lateralidade envolvem biologia, genética e ambiente. “Se uma criança tem pais canhotos, é mais provável que ela também seja canhota. No entanto, nem todos os pais canhotos têm filhos com essa tendência, pois os genes nem sempre são tão dominantes”, explica.
Ele acrescenta que lesões cerebrais durante o desenvolvimento embrionário podem, como mecanismo adaptativo, transferir funções ao hemisfério direito, resultando em canhotice.
Fonte: O Segredo





